Ministério Público pede fiscalização de poços artesianos irregulares no Estado

Ministério Público pede fiscalização de poços artesianos irregulares no Estado

Foto: Divulgação

O Ministério Público (MP) fez uma reunião para tratar do cumprimento do termo de cooperação voltado à regularização de poços artesianos no Estado. No encontro, na Capital, os representantes do MP reforçaram a importância do envio imediato de denúncias e pediram à Corsan investimentos contínuos na capacitação de suas equipes para apoiarem as fiscalizações e repassarem à Secretaria Estadual do Meio Ambiente as informações de grandes empresas e condomínios que estão usando poços artesianos clandestinos.

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Segundo a procuradora de Justiça Ana Maria Moreira Marchesan, a lei federal é clara e obriga que todos os consumidores tenham ligação de rede de água de seus imóveis com as companhias de saneamento nos locais onde há rede disponível – a exceção seria o uso de poços para fazer limpeza de áreas comuns, mas com outorga do Estado. Além dos motivos de saúde pública, para evitar riscos de contaminações à população pelo uso de poços irregulares, o objetivo é garantir que empresas e condomínios paguem pelo esgoto que geram. É que, ao consumirem só água de poços, os moradores não pagam taxa de água nem de esgoto, apesar de gerarem um grande volume de esgoto que as companhias, como Dmae na Capital, e Corsan, precisam tratar, mas sem receber.


O encontro contou com a participação de representantes do MP, do Departamento de Recursos Hídricos (DRHs) da Secretaria do Meio Ambiente (Sema), além de integrantes da Corsan.


Na reunião, foram debatidos casos de irregularidades constatadas em vários municípios e ações judiciais. A principal preocupação foi a vedação do uso de poços artesianos irregulares e a necessidade de conexão à rede pública de abastecimento, quando disponível, em conformidade com a política nacional de universalização do acesso à água potável. Dados apresentados indicam que o Estado possui mais de 400 mil poços irregulares, sendo que, de cada cinco poços lacrados nos trabalhos recentes, quatro apresentaram contaminação, diz a procuradora.


– Isso indica a necessidade de controlar o abastecimento humano através de poços para evitar a conexão e a eventual contaminação das redes públicas.


Ana Maria Moreira Marchesan falou na sexta-feira (29), à Rádio CDN, e detalhou as ações de fiscalização dos poços. Ela disse que a lei de Santa Maria, que tenta liberar o uso de poços artesianos, é inconstitucional. Confira:


Diário – Em Santa Maria, nos últimos tempos, a gente teve muitas polêmicas em relação a poços artesianos, até porque teve uma lei na Câmara de Vereadores, tentando liberar o uso dos poços. Porém, o MP vem desde 2008 com uma ação para cobrar a fiscalização dos poços irregulares em todo o Estado, é isso?

Ana Maria Moreira Marchesan – A Corsan nos pediu essa reunião porque temos um termo de cooperação de 2023 que envolve a Corsan e o DRHS para a gente incrementar as vistorias, as fiscalizações em relação a poços artesianos irregulares, ou seja, principalmente aqueles que estão em áreas onde há rede pública de abastecimento, em que segundo a legislação federal e estadual, e eu citaria aqui o artigo 45 da lei do saneamento básico, que diz que as edificações permanentes urbanas serão conectadas às redes públicas de abastecimento, de água e de esgotamento sanitário disponíveis e sujeitos ao pagamento de taxas, tarifas e outros preços públicos.

Vale dizer, onde há rede disponibilizada, é obrigatória a ligação da economia a essa rede. Onde não há, geralmente nas zonas rurais, daí sim, a pessoa pode pedir ao DRHS uma licença para perfuração do poço e para tentar obter a outorga daquele poço artesiano. Só que a gente tem no nosso Estado uma cultura terrível de perfuração clandestina de poços artesianos. Eu já trabalhei com esse tema vários anos na Promotoria de Meio Ambiente e agora a gente tem que retomar. É que temos as metas a cumprir em relação ao saneamento básico, sendo que a Corsan abarca a maior fatia de municípios no Estado e, se não houver essa regularização da conexão, esse pagamento, evidentemente que a própria companhia não terá condições de realizar as inúmeras obras que são necessárias para atingimento dessas metas. Então, é um tema de grande interesse ao Ministério Público, porque é um tema ambiental na medida em que há vários riscos na perfuração clandestina desses poços artesianos. É um tema de saúde pública, porque eventualmente um poço perfurado, ilegal e inadequadamente, ele pode se comunicar com a água da rede pública e gerar algum tipo de contaminação de doenças de veiculação hídrica. E é um tema que tem a ver também com a questão dos equilíbrios econômicos dos contratos na medida em que, evidentemente, tem de haver essa cooperação das pessoas para que se possa também realizar essas grandes obras de redes e de estações de tratamento de esgoto.

Diário – Por que o MP cobra o Estado e a Corsan para fiscalizar poços clandestinos e pede para fechá-los? É só para cumprir a lei e pelos riscos, porque a gente vê, às vezes, que tem prédios que pegam a água do poço, mas não colocam cloro e daí a água pode se contaminar na caixa?

Ana Maria – Exatamente. É por isso. Tem esse aspecto muito relevante. Mas a questão é que, nesses condomínios de Santa Maria, é histórico esse problema. Possivelmente porque o abastecimento não era muito bom aí no passado. Foi objeto da nossa conversa com a Corsan.

Diário – Ou seja, a pessoa pega e usa a água do poço, não paga para companhia, seja Corsan, seja Dmae, mas ela gera um esgoto que tem que ser tratado pela companhia, que não está recebendo para tratar esse esgoto, é isso?

Ana Maria – Porque é todo o sistema que garante a implantação dessas redes tão importantes para rumarmos ao desenvolvimento sustentável do Rio Grande Sul. É imprescindível esse subsídio cruzado, como a gente diz, entre a taxa de água e a construção das redes de esgoto.

Diário – E quem não concorda, teria de pressionar deputados para mudar a lei federal e permitir o uso de poços em qualquer lugar?

Ana Maria – Sim, o MP precisa defender a lei. Nem toda a lei é justa. Mas se saírem por aí, cada um a fazer o seu poço, daí quem vai pagar todas essas redes que nós precisamos fazer? O Estado já provou que não tem dinheiro para isso, tanto que privatizou, né? A Corsan, concorde ou não com ela, agora nós temos que procurar garantir um equilíbrio mínimo nesses contratos.

Diário – Faz sentido seguir com esse termo com a Corsan após ela ser privatizada?

Ana Maria – Teve um termo no passado, eu nem estava aqui nesse cargo, cujo teor, eu não conheço tão bem. Mas esse termo atual é novo, de 2023, e já com a Corsan/Aegea. E a companhia, ela não exerce o poder de polícia, tá? Ela nem pode exercer esse poder. Se algum agente da Corsan chegar dizendo que vai autuar, que vai fazer e acontecer, pode estar ocorrendo em um abuso.

Diário – Houve críticas aqui em Santa Maria de que isso teria ocorrido aqui.

Ana Maria – Isso. E aí, é como eu digo, não existe mais meia cidadania, né? Quem quiser denunciar, nós estamos abertos a receber essas denúncias. Procure identificar o nome, gravar a conversa, se possível. Já teve um ou dois casos que a gente recebeu, realmente fundamentado, de servidores que foram afastados pela própria Corsan. A empresa ajuda na identificação desses poços irregulares, ela ajuda o DRH, que não tem fiscais para fazer todo esse trabalho. E depois, o DRH vai lá e autua (a empresa ou prédio com poço irregular). Então, esse poder de polícia não é exercido e nem poderia ser feito pela Corsan/Aegea, ele é exercido pelo DRH Sema. Se houve algum caso nesse sentido, foi uma conduta abusiva com a qual o Ministério Público não compactua.

Diário – O que foi decidico nessa reunião? Vai ter avanço das fiscalizações no Estado?

Ana Maria – As fiscalizações continuam. Vai haver priorização dos grandes consumidores. Empresas que, eventualmente, têm poço em local onde não poderiam ter, porque têm rede, grandes condomínios. Universidades também. E aí tem o caso da UFSM, que é bem complexo. Será priorizada essa atuação em relação aos grandes consumidores e foram debatidos esses casos abusivos. A gente pede e a própria Corsan solicitou que, se o MP recebesse alguma denúncia, repassasse para eles procurarem avaliar e alterar o tipo de atuação ilícita ou abusiva. Criou-se um canal bem rápido, um fluxo entre o MP e a Corsan para esse tipo de coisa. E se solicitou à Corsan que fizesse capacitações periódicas com os seus funcionários para evitar um uso abusivo das previsões desse termo de cooperação.

Diário – Aqui em Santa Maria, houve uma grande seca em 1985, em que boa parte da cidade ficou sem água por meses e isso gerou a abertura de muitos poços. O vereador Tubias Callil criticou o fato de poços estarem sendo lacrados, mas que poderiam servir para abastecimento em secas. Seria possível liberar para uso em emergências, se houver seca?

Ana Maria – Eu não vou responder pelo órgão competente, que é o DRHS. Uma coisa que o município de Santa Maria tem que se convencer é que essa lei que eles aprovaram é inconstitucional. É que a água subterrânea, ela é bem público, cuja gestão cabe ao Estado. Não cabe ao município, nem à União. Então, eventualmente, numa seca, num evento climático extremo, e são muitos que nós vamos enfrentar ainda, infelizmente, essa demanda tem que ser direcionada ao DRHS, para poder liberar emergencialmente o uso desses poços.

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